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Sabe-se que o trabalho executado em condições insalubres expõe o trabalhador a uma situação de maior dano à sua saúde, gerando em prol do mesmo o direito ao recebimento do respectivo adicional.
Por sua vez, as atividades e operações perigosas, expõe o obreiro a situações de risco à vida, em virtude do contato permanente com inflamáveis e explosivos.
A importância de zelar por um local de trabalho salubre e seguro foi ganhando relevância ao longo dos anos, sendo que por meio da Constituição de 1988 houve a modificação quanto à orientação das normas constitucionais, especificando que o trabalhador teria direito à “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (art. 7º, XXII).
Assim, estabelece a atual Constituição, em seu artigo 7°, caput e incisos XXII e XXIII, que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social, a redução dos riscos inerentes do trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, bem como o adicional de remuneração de atividades insalubres e perigosas, além de reconhecer a tutela do meio ambiente do trabalho em seu artigo 200, inciso VIII e artigo 225.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) trata do assunto por meio dos artigos 189 a 197, prevendo o direito do trabalhador de receber os adicionais de insalubridade e periculosidade quando da exposição aos respectivos agentes.
Contudo, milhares de sentenças e acórdãos são proferidos anualmente no sentido que, não obstante o trabalhador tenha laborado sob a incidência de agentes insalubres e perigosos, necessário que ao final da demanda, opte pelo adicional que lhe for mais favorável.
Ainda é majoritário o entendimento encontrado na jurisprudência acerca da impossibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade sob o fundamento do artigo 193, § 2º da CLT.
Vejamos decisão proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região:
DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE E DE PERICULOSIDADE. Face à proibição de cumulatividade de percepção conjunta dos referidos adicionais (§ 2º, art. 193 da CLT), em havendo a conclusão de existência do direito ao pagamento tanto da periculosidade como da inslaubridade (em período concomitante do contrato de trabalho), o Juiz de Primeiro Grau, antes de encerrar a instrução, deverá ainda determinar que o reclamante faça a opção por um dos referidos adicionais, face à impossibilidade legal de pagamento de ambos concomitantemente. (Processo: RO 0001830-22.2012.5.15.0039. TRT/15, 6ª Turma – 11ª Câmara. Recorrente: CPIC Brasil Fibras de Vidro Ltda. Recorrido: Anderson Machado Monteiro)
A doutrina segue nesse mesmo sentido, conforme dispõe Sérgio Pinto Martins (Direito do Trabalho. Ed. Atlas. 2007, pg. 646):
“o empregado não terá direito a adicional de periculosidade e de insalubridade concomitantemente, devendo optar por um deles (§ 2º do art. 193 da CLT). Normalmente o empregado opta pelo adicional de periculosidade, pois este é calculado sobre o salário e não sobre o salário mínimo, sendo, portanto, mais vantajoso”.
No entanto, como nada no Direito é estático, principalmente quando se trata do Direito do Trabalho, o C. TST tem se posicionado pela possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade. Vejamos decisão:
“RECURSO DE REVISTA. CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E SUPRALEGAIS SOBRE A CLT. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO STF QUANTO AO EFEITO PARALISANTE DAS NORMAS INTERNAS EM DESCOMPASSO COM OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INCOMPATIBILIDADE MATERIAL. CONVENÇÕES NOS 148 E 155 DA OIT. NORMAS DE DIREITO SOCIAL. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. NOVA FORMA DE VERIFICAÇÃO DE COMPATIBILIDADE DAS NORMAS INTEGRANTES DO ORDENAMENTO JURÍDICO. A previsão contida no artigo 193, § 2º, da CLT não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, que, em seu artigo 7º, XXIII, garantiu de forma plena o direito ao recebimento dos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade, sem qualquer ressalva no que tange à cumulação, ainda que tenha remetido sua regulação à lei ordinária. A possibilidade da aludida cumulação se justifica em virtude de os fatos geradores dos direitos serem diversos. Não se há de falar em bis in idem. No caso da insalubridade, o bem tutelado é a saúde do obreiro, haja vista as condições nocivas presentes no meio ambiente de trabalho; já a periculosidade traduz situação de perigo iminente que, uma vez ocorrida, pode ceifar a vida do trabalhador, sendo este o bem a que se visa proteger. A regulamentação complementar prevista no citado preceito da Lei Maior deve se pautar pelos princípios e valores insculpidos no texto constitucional, como forma de alcançar, efetivamente, a finalidade da norma. Outro fator que sustenta a inaplicabilidade do preceito celetista é a introdução no sistema jurídico interno das Convenções Internacionais nos 148 e155, com status de norma materialmente constitucional ou, pelo menos, supralegal, como decidido pelo STF. A primeira consagra a necessidade de atualização constante da legislação sobre as condições nocivas de trabalho e a segunda determina que sejam levados em conta os – riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes -. Nesse contexto, não há mais espaço para a aplicação do artigo 193, § 2º, da CLT. Recurso de Revista de que se conhece e a que se nega provimento”. (RR – 1072-72.2011.5.02.0384 , Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 24/09/2014, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 03/10/2014)”
Contudo, recentemente o Tribunal Superior do Trabalho (TST), surpreendeu a todos, em especial, os militantes da área, ao não reconhecer valor às Convenções Internacionais da OIT, n.º 148 e 155, Convenções estas que se encontram devidamente ratificadas pelo Brasil e que estão em pleno vigor no ordenamento jurídico.
A Corte, ao reformar o entendimento da 7ª Turma do TST, no julgamento do processo RR-1072-72.2012.5.02.0384, decidiu sob o seguinte fundamento:
“Data vênia do entendimento esposado por Sua Excelência e pelos Exmos. Ministros que o acompanharam, as Convenções 148 e 155 da OIT não contêm qualquer norma explícita em que se assegure a percepção cumulativa dos adicionais de periculosidade e de insalubridade em decorrência da exposição do empregado a uma pluralidade de agentes de riscos distintos. (…) Penso, ainda, que, a par de não conterem dispositivo formalmente em contraposição ao § 2º do art. 193 da CLT, as Convenções 148 e 155, assim como é característico das normas internacionais emanadas da OIT, ostentam conteúdo aberto, de cunho genérico. Funcionam basicamente como um código de conduta para os Estados-membros. Não criam, assim, no caso, direta e propriamente obrigações para os empregadores representados pelo Estado signatário”.
A posição adotada pela Corte do TST mostrou-se totalmente equivocada, haja vista que o trabalhador que exerce suas atividades sob a incidência de agentes nocivos à saúde e exposto a elevado risco à vida, teria pleno e justo direito ao recebimento de ambos adicionais.
Muitos juízes e doutrinadores argumentam que o pagamento cumulativo dos adicionais geraria bis in idem. No entanto, mencionado entendimento não se sustenta, uma vez que o pagamento se daria sobre fatos geradores completamente distintos, pois, conforme já mencionado, um adicional tem como finalidade compensar prejuízos causados à saúde e o outro, relaciona-se quanto o risco à vida.
Segundo posição consolidada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), os tratados e convenções internacionais que são ratificados pelo Brasil, possuem prevalência sobre todas as demais normas infraconstitucionais, estando aí incluso o § 2º do art. 193 da CLT.
Assim, faz-se claro que as Convenções da OIT n.º 148 e 155 deveriam prevalecer sob o § 2º do art. 193 da CLT, eis que consagram normas mais favoráveis ao trabalhador e não o contrário. Além disso, uma vez ratificada a Convenção por um Estado membro, suas normas adquirem status constitucional, devendo ser aplicadas aos casos concretos.
Por Valéria Martins Silva, advogada no escritório Henrique & Gaspar Sociedade de Advogados e pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho na Universidade Presbiteriana Mackenzie, no campus Campinas.
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